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Lyra e Menescal contam histórias sobre a Bossa Nova em DVD

(materia especialpara o iG)

O documentário intimista “Bossa Brazil – Histórias sobre o nascimento da Bossa Nova”, narrado por Carlos Lyra e Roberto Menescal, foi lançado há algumas semanas no Reino Unido e já está esgotado em algumas lojas especializadas. Escrito e dirigido pelo cineasta brasileiro Paulo Thiago, o documentário revela episódios dos primórdios da bossa nova.

Entre os diversos “causos”, está a primeira apresentação de Carlos Lyra e Roberto Menescal, juntamente com a cantora Silvinha Telles, ainda no colegio Mallet Soares, em 1956, em Copacabana. O cartaz anunciava a cantora e um “Grupo Bossa Nova”. Curioso, Menescal foi perguntar ao diretor quem era o tal grupo que tocaria também. Meio constrangido, o professor desculpou-se e revelou que eram eles mesmos, e como não sabia o nome do grupo formado por Lyra e Menescal, colocou simplesmente “bossa nova”.

Em meio a essa e outras lembranças, o espectador entende como e por que esse movimento nasceu no Rio de Janeiro. Guiado pelas fábulas de Lyra e Menescal, todos os principais músicos participantes desse estilo são relembrados. Durante quase duas horas, a dupla passa pelo hotel Plaza Copacabana, pela Hípica, pelas salas de aula onde montaram Academias de Violão, nos anos 70, pelo apartamento de Nara Leão, apartamento de Lyra – onde João Gilberto assoviava para a mãe de Carlos o chamar para tomar um café – e por todos os cenários que marcaram o nascimento da bossa nova.

Outros músicos e personalidades que contribuem com o relato e, é claro, cantam sucessos entre um e outro fato são Sérgio Cabral, Alaíde Costa, Arthur da Távola, Carlos Diegues, João Donato, Durval Ferreira, Paulo Jobim, Luís Carlos Miele, Nelson Motta, Iko Castro Neves, Sérgio Ricardo, Ronaldo Bôscoli, Elizeth Cardoso, Vinicius de Moraes, Astrud Gilberto, João Gilberto, Antonio Carlos Jobim, Nara Leão e Otávio Terceiro. Sem dúvida, imperdível.

http://igpop.ig.com.br/bossanova/noticias/2008/08/31/lyra_e_menescal_contam_historias_sobre_a_bossa_nova_em_dvd_1607092.html

Teatro une brasileiros e britânicos em produção bilíngüe

Dois palcos, dois teatros, duas peças. Assim se divide a companhia de teatro Nós do Morro que, até o sábado, 18, está em cartaz em Londres com dois espetáculos

Caliban e Miranda

Caliban e Miranda

A temporada inglesa de “Knoking Against My Heart” vai até o dia 20 de novembro, porém em Londres, a última apresentação acontece neste sábado, 18, no Unicorn Theatre, em London Brigde. A peça é uma criação conjunta entre a companhia de teatro inglesa Theatre Center e a brasileira Nós do Morro, numa união orgânica e perfeita entre duas culturas, duas comunidades e duas línguas.

“Quando eu conheci a companhia brasileira de teatro Nós do Morro, em 2005, trabalhando com o filme ‘Hackney to the Favela’, eu vi o exemplo maravilhoso que através da magia do teatro eles representavam. Pela vontade imensa de voltar a trabalhar com eles, num processo criativo mais intenso e com uma colaboração maior de seus atores, eu desenvolvi este projeto. Convidei o escritor e dramaturgo, Dipo, para ir até o Rio de Janeiro a fim de conhecer o grupo e se inteirar da realidade local. Nós não tínhamos nada escrito, apenas a escolha inicial da peça ‘A Tempestade’, de Shakespeare, então começamos com a folha em branco. Toda a peça foi concebida de um processo único de criação entre eu, o escritor e os atores”, revela o diretor Michael Judge, responsável pelo projeto de “Kocking Against My Heart”.

Um dos atores brasileiros, integrante do Nós do Morro desde 1989, André Santinho reafirma a diferença no processo criativo desta peça em particular. “Os atores estavam presentes durante todo o tempo, em cada minuto colaborando com a elaboração do roteiro e dramaturgia. Baseado em nossas improvisações e jogo de cena que surgiu a brincaderia com os animais. Nossos movimentos corporais, dança, capoeira, musicalidade que levou o diretor e escritor a tomar este rumo e chegar no que você viu no palco”, comenta André que tem em seu currículo o filme “Tropa de Elite”, recém lançado no Reino Unido.

Seu conterrâneo é William de Paula que reconhece a dificuldade de interpretar em inglês. “Todo dia eu pratico e treino, porque realmente é muito grande a diferença do som do Português e do Ingl.ês Achar a ritmo, o balanço, a acentuação correta das palavras. Imagina o Caliban ter que falar de amor em duas línguas”, brinca.

Durante os 60 minutos, tanto anglos quanto lusofônicos são capazes de entender o espetáculo que utiliza – o tempo todo – os dois idiomas. Três, dos quatro atores em cena, falam português. Além de serem amparados por outros tipos de linguagens como a corporal, expressões, música, sons, entre outras; a equipe é taxativa ao enfatizar o aprendizado individual que este processo coletivo de montagem possibilitou.

Aclamada por pessoas do meio teatral, este processo criativo um tanto único e que obteve um resultado tão mágico e belo transparece nitidamente o quanto palavras e línguas são supervalorizadas no cotidiano.

“Quem fala duas línguas, seja de criança, pela familia, ou aprendido pela vida, vai descobrindo que a língua, o idioma é só um código usado para falar as mesmas coisas, para nos comunicarmos. Um código é de uma maneira e o outro é de outra, e usando as diferenças é que unimos”, exemplifica a estreiante Mariana Whitehouse, que é filha de mãe brasileira e pai inglês.

Seja brasileiros, inglês, português, africano, latino ou chineses; seja qual for a língua falada; este espetáculo é prova de que a linguagem universal do teatro e sua magia ultrapassam qualquer barreira e passa a mensagem sem – ‘misunderstood, got it?’ – desentendimento, sacou?

Nós do Morro no Barbican

Divulgacao

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A companhia de teatro carioca Nós do Morro está em cartaz, nos palcos do Barbican, até o sábado, 18, com a peça shakespeariana “Os dois Cavaleiros de Verona”. Explorando os temas universais do amor, fidelidade, traição e amizade no universo jovem, a apresentacao aproximam-se de sua linguagem popular e musical bem brasileira, tendo em vista, especialmente nesse caso, sua apresentação para o público internacional e tendo como fundamento a certeza de que a arte é o meio primordial para a ruptura de qualquer barreira existente para o entendimento e compreensão de universos culturais, lingüísticos e nacionais diversos. Além disso, o texto de Shakespeare suscita uma reflexão a ser explorada na concepção artística do espetáculo ao apresentar o dilema entre a atração de centros de cidade ou centros sociais e culturais, considerados mais desenvolvidos e propícios para ascensão social e complementação cultural dos jovens frente ao dilema da opção pelo amor e permanência, por ele, na província.
O grupo foi convidado pelo Barbican Centre para participar das comemorações dos 10 anos do festival “Bite”, o Nós do Morro está alocado no Pit Theatre. O Barbican é o maior centro de multi-arte da Europa e o festival “Bite” desenvolve há oito anos um programa de caráter único pela multiplicidade de produções abrangendo teatro, música, artes visuais, dança e comédia, sempre com novas idéias e propostas artísticas.
Barbican – The Pit
Até dia 18 / às 19:45, 14:30
Tickets: £12
* Em Português com legendas em Inglês

Filme sobre Jean Charles agita comunidade brasileira em Londres

Selton Mello como Jean Charles

Selton Mello como Jean Charles

Na última quinta-feira, 18, a equipe de gravações do filme sobre a vida do brasileiro Jean Charles de Menezes encerrou os trabalhos na capital britânica. Eles continuam filmando por mais algumas semanas, no Brasil, e pretendem lançar o filme na metade de 2009, provavelmente, próximo a data que marcará quatro anos da trágica morte, ocorrida na estação de metrô Stockwell, quando Jean foi morto com sete tiros pela Polícia britânica, em 22 de julho.

Foram dois meses de trabalho intenso e que agitou a comunidade brasileira em diversos sentidos. Atores novatos que foram grandes revelações durante as filmagens como o açougueiro Marcelo Madureiro Soares e o bancário Rogério Antônio Dionísio, que interpretaram os irmãos Barroso, Chuliquinho e Bislei. Os dois foram destacados por suas interpretações tanto pelo diretor do filme Henrique Goldman, como por um dos atores principais, Selton Mello, que interpreta o Jean Charles. Centenas de outros brasileiros que moram em Londres também participaram do filme como atores e figurantes.

Com tantos artistas pela cidade outros muitos tiveram a oportunidade de tirar foto e até conversar um pouquinho com estrelas como Selton Mello – que estava sempre disposto a tirar fotos com os fãs –, Vanessa Diácono, Luis Miranda e Sidney Magal – que mostrou-se um animador excelente nas gravações de seu “show” para uma das cenas do filme. O filme tem como Diretor de Fotografia Guillermo Escalon, Produção de Luke Schiller, e Produtores Executivos Stephen Frears e Rebecca O’Brien. A produção está orçada em torno de R$ 8 milhões.

A família, após muita insistência do diretor Henrique e ter passado um pouco os piores momentos do acontecido, suporta e auxilia o filme. Tanto que a prima de Jean, Patrícia Armani, participa como atriz do filme interpretando ela mesma. “Nós, eu, Vivian e Alessandro, ajudamos contando como o Jean era, do que ele gostava, o que ele fazia. O Henrique me convidou para fazer meu próprio personagem no ano passado. Eu achei uma loucura! Topei e desisti várias vezes, pois nunca tinha me passado pela cabeça ser um atriz. Na realidade eu não sou atriz, por favor! E eu fazer eu mesma, achava um pouco complicado, como até agora ainda estou achando, mas está sendo uma experiência muito legal”, revelou Patrícia ao Brazilian News.

O BN também conversou com Henrique Goldman e Selton Mello. Confira trechos da entrevista abaixo.

O diretor, Henrique Goldman

Brazilian News: Quando você ouviu a história do Jean Charles e, a partir daí, como surgiu a idéia do roteiro?
Henrique Goldman: A primeira vez que ouvi foi no dia em que mataram ele. Como todo mundo, eu sabia que tinham matado um terrorista no metrô e, como a maioria, senti-me aliviado, pois vidas de inocentes seriam poupadas. No dia seguinte, minha esposa me ligou e disse que o rapaz que mataram era brasileiro, que o terrorista era brasileiro. Eu disse “Imagina, você está louca, de jeito nenhum o terrorista vai ser um brasileiro”. Daí, em seguida, a gente veio a saber o quê realmente era.
Logo depois eu me interessei em fazer o filme. Eu estava pensando em fazer um documentário, mandei o projeto para a BBC, para o Channel 4, mas era logo depois e não houve interesse. Passaram-se alguns meses eu recebi um e-mail do Fernando Meirelles, que é um amigo, o diretor do “Cidade de Deus”, dizendo que iriam me procurar para saber se eu queria dirigir o filme.
Então, começou como este projeto para a BBC que acabou não acontecendo, ainda bem, pois era um projeto ruim, mas eu ia fazer para tentar mostrar algo sobre o fato. Mas a BBC tirou o filme da tomada e eu peguei o projeto para mim. Comecei a escrever o roteiro com o Marcelo Starobinas.

BN: Qual o principal motivo por você ter vestido a camisa do filme?
Goldman: Por alguma razão, por questões autobiográficas… Eu me identifiquei com essa história. Eu sou fascinado por “outsiders”. Todos os filmes que eu faço acabam, de um modo ou de outro, sendo a respeito de “outsiders”, estrangeiros, gente estranha em terras estranhas. E essa história é isso: brasileiro aqui em Londres. Aí a gente começou a investigar a vida dele, para saber quem era o Jean Charles. Investigar não no sentido policial, mas de descobrir quem era a pessoa. Eu descobrir muitas coisas em comum entre eu e ele.

BN: Como você descreveria o brasileiro Jean Charles
Goldman: Ele era um sonhador, um cara ambicioso, um batalhador, um trambiqueiro, muito engraçado, caótico, boa gente, invocado, mulherengo. É uma pessoa bem contraditória, complexa, interessante também.

BN: E como você se identificou com ele? Em que sentido?
Goldman: Na verdade, eu acho que quando a gente conta uma história, que tentamos primeiro encontrar uma coisa que nos conecta com a história, com a esperança que o quê nos conecta também conecte ao público com a história. O lado universal da história. E essa coisa do “outsider” é um tema universal. Tema de quem está no estrangeiro, em terra estranha, tem a ver com a Bíblia, são coisas que tem a ver com a Odisséia, com mitologia de muitas culturas. E, assim, espero que muitas pessoas, como eu, encontre alguma conexão com o personagem.
A minha conexão foi brasileiro em Londres, idealista, sonhador, essa coisa do mundo dos brasileiros em Londres. Isso me fascina muito! Pois aqui você encontra um tipo de um extrato purificado do Brasil, um mínimo denominador comum de todo o Brasil está aqui reunido. Como se fosse um sumo concentrado do Brasil. O mundo do filme é o mundo dos peões brasileiros aqui em Londres, dos motoboys. Eu nunca conheci nenhum goiano no Brasil. Todos os goianos que eu conheço estão em Londres. Existe esse um Brasil que eu só vim encontrar aqui. Talvez a gente se sinta mais brasileiro em Londres do que no Brasil, e isso também é uma coisa comum a todos os estrangeiros, em todas as culturas.

BN: O filme culpa e acusa a polícia pela morte de Jean Charles?
Goldman: Apesar de não ser um filme sobre a polícia, apesar de não ser um filme deliberadamente político o filme tem implicações políticas e é uma denúncia, espero que a mais forte possível, contra a polícia. Pois eu acho que para as pessoas se revoltarem e ficarem mais conscientes do absurdo que foi o comportamento da policia, a gente não precisa falar da polícia, a gente precisa falar quem foi o Jean Charles. Mostrar para as pessoas quem foi morto. O quê o mundo perdeu e a dor da família dele. Que um cara tão legal, tão amante da vida, tão engraçado foi morto de um jeito tão absurdo! E, depois, o comportamento absurdo da polícia de ter tentado sujar o nome dele, encobrir as mazelas. O filme é um libelo contra a polícia, no fundo. Só que o tema principal não é a polícia, mas emocionalmente a gente espera que a revolta das pessoas contra a polícia seja maior ainda.

BN: Como foi a aproximação de vocês com a família? Como eles estão colaborando com o filme?
Goldman: A família do Jean, especialmente os primos, sofreu muito. Claro que os pais também sofreram, mas o filme é sobre os primos que estavam morando aqui com ele. Eles foram tratados muito mal pela imprensa, pela polícia, eles foram usados. No princípio, com razão, eles tinham muitas suspeitas de quem iria fazer um filme, o que é totalmente compreensível, mas acredito que com o tempo a gente se aproximou. Tanto é verdade que a Patrícia [Armani], uma das primas faz papel de si mesma no filme. Eles todos, de uma maneira ou de outra, colaboram com o filme. Então foi interessante, o depoimento deles foi muito importante, muito válido.

BN: Vocês estão utilizando bastante a comunidade brasileira, de Londres, no filme. Figurantes e atores também, certo?
Goldman: Nós ficamos um ano e meio procurando na comunidade brasileira de Londres o que há de melhor, entre motoboys, peões, etc. Encontramos gente que nunca tinha atuado na vida, como o Marcelo que é açougueiro da Casa de Carnes Brasil, que faz o papel de Chuliquinho, o cara é… nossa! Ele é um monstro de ator! É maravilhoso, mas é mesmo, é comovente, engraçado, um talento incrível!

BN: E como está sendo a experiência de trabalhar com esses “novos talentos”?
Goldman: Ah! Um tesão! Não tem outro jeito de dizer. É que este filme tem toda uma dualidade. Por um lado é baseado em fatos reais, mas em nosso roteiro nós ficcionalizamos os fatos reais. Por um lado a gente tem atores que nunca trabalharam e pessoas que fazem papel de si mesma, e, por outro, a gente tem Selton Mello e Vanessa Giácomo. Por um lado é um filme brasileiro, por outro é um filme inglês. Ele é um filme cheio de dois lados.

BN: Como você definiria a comunidade brasileira em Londres?
Goldman: São, na maioria, jovens sonhadores, ambiciosos, gente que trabalha duro. Mas o engraçado é que sempre os estrangeiros são retratados aqui na Europa do mesmo jeito. A direita retrata com medo, como uma doença que está invadindo a Europa. A esquerda retrata como um bando de coitadinhos. Mas a minha experiência na comunidade brasileira não é nem uma coisa, nem outra. Ninguém é coitadinho, são jovens ambiciosos, trabalhadores, sonhadores, gente que vem para cá dar duro, que se sente livre, muitas vezes, da caretice das famílias, vem pra cá para fazer uma grana e ter uma vida melhor. Por tudo isso, o nosso filme é um filme que celebra a imigração. Tem que vir mais pra Londres. Manda o pessoal para Londres!

Jean Charles, Selton Mello

BN: E de alguma maneira chamou sua atenção o caso do Jean?
Selton: Chamou sim, sempre chama, mas não foi uma história que marcou profundamente. Foi mais uma das histórias violentas que a gente ouve todos os dias, sobretudo no Jornal Nacional. Como da vez que arrastaram uma criança no carro, no Rio de Janeiro, ou matam alguém em São Paulo, etc. Mataram um brasileiro no metrô em Londres.

BN: Como foi o contato com o roteiro?
Selton: Foi há três anos e meio, o Henrique [Goldman] me procurou dizendo que queria fazer um filme sobre esse caso. Eu lembrava do caso e achei interessante, mas queria ler o roteiro pra saber melhor o que ele queria mostrar. Desde o início, o que mais gostei dessa história, foi que quando ele morreu ninguém sabia quem era esse cara. Uma pessoa que morreu de uma maneira equivocada, a polícia cometeu um erro, matou um cara inocente, mas quem era Jean Charles? O que ele fazia? Como ele era com os amigos e família? E é isso que o filme se propõe a contar, a vida desse personagem. Mas não só a história do Jean, mas a vida dos brasileiros que vivem aqui em Londres. Daqueles “mais raladores” que vem para cá e trabalham como “cleaner” das 8 da manha às 10 da noite para juntar um dinheiro para mandar pro Brasil. Parece que vivem um conto de fadas em Londres, mas na verdade estão ralando para levantar um dinheiro. Muitas vezes nem saem para juntar, economizar e mandar o que conseguem para o Brasil. E esse era o universo no Jean aqui e é um universo interessante de ser contado.

BN: Rolou algum comentário comparando você e o Jean Charles?
Selton: Rola sempre. Mas o intimidador é até a página sete, a partir do momento que eu relaxei com isso tudo bem. Afinal, ninguém o conhece, o mundo não conhece o Jean Charles, como ele era, como ele andava, como ele falava. O que se viu foi uma foto, duas, mas foto. Nem vídeo dele tem. Então, na verdade, 99% do público vão conhecer o Jean Charles que eu fizer. E o outro 1 % é a família e parentes que vão falar que ele não era assim, que ele não falava desse jeito, enfim. Eu criei o meu Jean baseado em coisas que eu ouvi, mas não fiquei querendo imitá-lo, pois nem um vídeo de festa de aniversário existe dele. Eu fiz o meu Jean Charles.

BN: Para o Selton Mello, quem foi o brasileiro Jean Charles?
Selton: Um entre muitos que vem para cá [Londres] com o sonho de juntar dinheiro e, de repente, voltar com uma grana que não conseguiria juntar no Brasil. Existe esta idéia de Europa, Londres, terra da oportunidade. Muitos brasileiros têm esse discurso “Ah! Não volto pro Brasil” “Por quê?” “Porque aqui eu comprei esse laptop, tenho essa televisão de plasma que lá eu não teria”. O motivo é unicamente pelo poder da compra, que o dinheiro vale mais. As pessoas nem ganham tão bem assim, mas conseguem ter algumas coisas extras. Os brasileiros aqui têm o básico que no Brasil nem sempre é possível ter. E isso que acho que define bem, o Jean foi um sonhador. Um sonhador que veio para Londres tentar melhorar a vida, e ainda trouxe mais primos na esperança de não só ajudar ele, mas para fazer com que os outros também cresçam. Isso eu achei muito interessante. E, foi interrompido! Um sonho interrompido.

BN: Como que está sendo a sua experiência de trabalhar com esses figurantes que são personagens e que são reais também?
Selton: Eles não são figurantes, há a expressão não-atores. Eles são não-atores que estão em cena. Eu acho que eles oxigenam a interpretação do filme exatamente por não terem vícios de interpretação – eles são eles – então, tem muita força o que eles fazem. E alguns foram gratas surpresas de gênio! Tipo um cara que chama Marcelo [Madureiro Soares]. Na verdade, dois atores que fazem os irmãos Barroso, são dois caras que não são atores e são brilhantes! O quê eles fizeram no filme é digno de ator de verdade.

BN: Este é seu primeiro filme fora do Brasil. Qual a diferença?
Selton: É interessante ver que uma equipe funciona exatamente da mesma forma. Exatamente! O set é tocado da mesma forma. As hierarquias no set, tudo igual. É curioso de ver isso, mas em inglês, numa outra cultura. Temos uma equipe muito bacana reunida, muito talentosa e a fim de fazer, o que torna o trabalho muito prazeroso. Porém, em Inglês. Às vezes, coisas banais que estou acostumadíssimo a fazer em Português tenho que ficar pensando como vou fazer para trocar para o Inglês. Eu consigo me virar na língua, mas tem vezes que é difícil, que não consigo traduzir, mesmo coisas simples. É por isso que está sendo uma experiência boa, pela dificuldade também de se expressar.

BN: Esta é a sua primeira vez em Londres?
Selton: Não, é minha terceira vez em Londres e eu continuo sem conhecer a cidade. A primeira vez eu fiquei em Elephant & Castle na casa de um amigo que estava doente, então ele não podia sair muito comigo eu fiquei mais em casa. Não conheci. No ano passado eu vim aqui para gravar para a Globo. Quatro dias, gravei o dia inteiro. Na primeira brecha que eu tive, sai com o Henrique para conhecer parte da família. Desta vez, a gente está num local tipo Diadema. Então, estamos hospedados em Diadema, com todas as coisas legais e turísticas de Londres bem longe. Além do que, nós trabalhamos todos os dia das 7 ou 8 da manhã até às 7 da noite. Quando volto para o hotel não tenho saúde para pegar um táxi, meia hora para ir ao pub, nem sei onde. Quando falamos que estamos filmando em Londres, as pessoas pensam que estamos numa boa em Londres, ator internacional! Mas que nada, todo mundo ralando, trabalhando direto, então esta é a minha terceira vez aqui e continuo sem conhecer Londres. Talvez na época da “Premier” eu consiga ficar uma semana, num lugar mais próximo do centro e vou nos lugares mais legais.

BN: Ainda mais alguém conhecido como você, que todos te reconhecem e vêm falar contigo.
Selton: Verdade, é mais fácil para um ator identificar isso porque as pessoas reconhecem a gente. Mas é muito louco, outro dia estava andando, entrei num café para comer algo, daí já veio “maitre” que era português. E, em Portugal, eles assistem bastante às novelas brasileiras, são fãs. Ele veio tirar uma foto e começou a chegar mais gente. Ele chamou o cozinheiro, brasileiro; veio a faxineira, brasileira. Foi aparecendo brasileiro assim, do nada. Isso mostra como tem por aqui. Então, são muitos “Jeans Charles”. Muitos que vieram nessa de tentar juntar um dinheiro, trabalhar, a maioria fica aqui quatro anos e volta sem falar Inglês. Exatamente porque tem muito brasileiro e se você bobear fica aqui só falando Português. Não volta nem com esse bem, que para mim o maior bem que essas pessoas poderiam levar. Não o dinheiro, mas sim o conhecimento e outra língua.

Filme sobre Jean Charles de Menezes

Brasileiros acompanha as filmagens do longa sobre Jean Charles, morto por engano pela polícia britânica em 2005. Veja mais sobre o filme em breve, na edição impressa da revista!

– Assista ao arquivo multimidia gravado pela jornalista Paula Medeiros, disponivel no website http://www.revistabrasileiros.com.br/

“Linha de Passe” estréia no Reino Unido dia 19

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Daniela Thomas e Walter Salles se reuniram para retratar a realidade fria, dura e violenta dos subúrbios paulistanos. E eles conseguiram, no longa “Linha de Passe”, que estréia na próxima sexta-feira, 19, em todo Reino Unido. Desta vez, a dupla de diretores descrevem uma família de quatro irmãos, o caçula de pai negro e desconhecido, e a mãe solteira e grávida novamente.

Estes personagens são interpretados por atores estreiantes no cinema João Baldasserini (Dênis), José Geraldo Rodrigues (Dinho), Caique de Jesus Santos (Reginaldo), Sandra Corvelini (Cleuza); além de Vinícius Oliveira (Danio) que fez “Central do Brasil”, também pelas mãos de Salles.

O filme foi concorrente fortíssimo a Palma de Ouro do Festival Internacional de Filmes de Cannes, aclamado pela crítica internacional, sendo que a atriz Sandra Corvelini recebeu o prêmio de melhor atriz. Na ocasião, Salles e Daniela subiram ao palco por Sandra, ambos bastante emocionados. Ele agradeceu a contribuição de Sandra, dizendo que ela foi realmente uma mãe para os quatro jovens atores. Daniela disse que a atriz vencedora não pôde vir a Cannes por causa de uma gravidez interrompida, mas que seria muito importante, num momento desses, receber reconhecimento por uma entrega que foi tão visceral.

Corvelini levou o troféu, mas a interpretação dos quatro atores é essencial para o sucesso da narrativa. Com uma linha de improvisação muito forte, do qual o processo das filmagens e montagem foi baseado, a conexão e sincronia dos atores em cada cena torna-se chave no desenvolvimento do enredo de uma maneira fabulosa.

Histórias singulares como Dario que passa a infância e adolescência treinando futebol, concorrendo as “peneiras” dos clubes, na esperança de virar um grande astro dos gramados, expondo também o “lobby” que existe neste mundo futebolístico. Dinho, o “crente”, que se redime de pecados passados e se converte a igreja evangélica. Dênis, o “motoboy”, trabalha horas demasiadas e corre todos os riscos que as centenas e milhares de motoqueiros entregadores de encomendas em São Paulo estão sujeitos. O caçula Reginaldo, negro, não sabe quem é seu pai, anda o dia inteiro de ônibus, pois a única informação que tem é que era motorista. A mãe Cleuza, empregada doméstica, sem carteira de trabalho assinada, continua bebendo e fumando e se pendurando na janela do edifíciu onde trabalha, apesar de estar prester a ganhar a criança.

Realidade nua e crua de uma família pobre da periferia é o que o “Linha de Passe” retrata. Triste, verdadeiro, envolvente e emocionante. Um filme para convidar os amigos estrangeiros a irem assistir e, ao final, falar – com uma mistura de orgulho e vergolha – “Isto é Brasil”.

Carnaval de Notting Hill: uma mistura de ritmos, comidas, músicas e etnias

Paraiso 2008 by Randes Nunes

Paraiso 2008 by Randes Nunes

”Maior festa de rua da Europa” deve atrair mais de dois milhões de foliões neste final de semana

Todo o ano, desde 1966, durante o Bank Holiday de agosto, acontece o
Carnaval de Notting Hill, considerada a maior celebração e festa de rua
em todo continente europeu. Porém, a origem da festa não é nada comemorativa.

No início dos anos 60, havia um grande número de imigrantes caribenhos
vivendo em Londres, e, por sofrerem discriminação racial, eles
decidiram manifestar-se de uma maneira pacífica e alegre: dançando
pelas ruas do bairro de Notting Hill. Os precursores do movimento, que
já acontecia em forma de festas dentro das casas, foram Rhaune Laslett
e Claudia Jones, reconhecida como a “Mãe do Carnaval de Notting Hill”,
uma defensora severa da liberdade de expressão dos negros em Londres.

Em 1976 e anos subseqüentes, com um público que já ultrapassava os
cem mil e continuava predominantemente afro-caribenho, o Carnaval de
Notting Hill passou por momentos difíceis com vários protestos raciais
exacerbados, problemas e brigas com a Polícia Metropolitana, greves e
passeatas misturadas aos foliões.

Com a confusão, houve uma vasta cobertura midiática dos eventos, nem sempre de uma
maneira apropriada e sem censura mostrando os dois lados, o dos
policiais e o dos protestantes. Cogitou-se até a extinção da festa,
porém figuras importantes, como o Príncipe Charles, apareceram como
defensores ferrenhos do Carnaval.

Mais recentemente, os números mostram que o Carnaval londrino não pára de
crescer e a festa está totalmente voltada para diversão,
entretenimento, expressão artística e cultural de vários grupos de
imigrantes que fazem de Londres uma das cidades mais cosmopolitas do
mundo – se não A mais.

Claro que brasileiros continuam torcendo o nariz para a festa, pois não consideram o desfile
um “carnaval” propriamente dito – para padrões verde-amarelos – e,
realmente, não é possível a comparação entre o carnaval do Rio de
Janeiro ou Salvador. Mas a intenção é o que continua valendo e, a cada
ano, graças a participação de blocos e escolas de samba brasileiras
sediados em Londres, o tempero brasileiro vem incrementando a mistura
caribenha e latina pela qual o carnaval é caracterizado. A London
School of Samba e Paraíso School of Samba levam um pouco do estilo
brasileiro de pular carnaval para Notting Hill, com passistas, foliões
vestindo fantasias, carros alegóricos, bateria e alas.

Apesar das controvérsias sobre a segurança do evento e quantidade de pessoas
que tem comparecido, até mesmo a prefeitura de Londres está envolvida
para promover, organizar e tornar o Carnaval cada ano melhor. Em 2002,
para facilitar o passeio dos blocos, grupos, bandas e carros, a rota
foi alterada. E mais alterações e ampliações ainda estão sendo
estudadas para o desfile deste ano. Pesquisas divulgadas em 2003
revelaram que o evento contribui com cerca de 93 milhões de libras para
a economia de Londres.

O prefeito de Londres, Boris Johnson, afirmou que o Carnaval atualmente é um evento inimitável
e atrai não só londrinos, mas pessoas de todos os lugares do país e
mundo. Aliás, este é o tema da edição 2008 “Mundo, seja bem-vindo”.

“Esta festa ilustra a energia e as cores de nossa grandiosa cidade e, o
evento deste ano, coincide com a cerimônia oficial de encerramento dos
Jogos Olímpicos de Pequim, então, será ainda mais especial”, promete
Johnson.

A Música
A música é o coração do Carnaval de Notting Hill, ecoando batidas e ritmos fortes
pelas ruas desse bairro nobre londrino. Historicamente as “steel bands”
– bandas típicas do Caribe que tocam “panelas” de metal semelhantes a
tambores – espalham os sons da Soca e Calypso, contudo, mais
recentemente, ritmos como o Reggaeton, Reggae, R&B, Funk, House,
Dub e muitos outros também conquistaram seu espaço. Dezenas de palcos
são montados durante o Carnaval para apresentações culturais e
folclóricas.

O Desfile
São mais de cinco quilômetros percorridos pelas ruas de Notting Hill,
Bayswater – onde a concentração de brasileiros é bastante considerável
–, Queensway e Holland Park onde fantasias coloridas, plumas, roupas
típicas caribenha e muitas coreografias criativas e divertidas desfilam
alegrando e contagiando quem está em volta e pretendia somente
assistir. No domingo, o dia é dedicado a famílias e a participação de
crianças é maciça. Na segunda-feira o público é mais numeroso e
agitado.

As fantasias
Muitos grupos iniciam a confecção das fantasias e apetrechos meses
antes do Carnaval. Alguns são altamente profissionais e desenvolve todo
o designer utilizado, outros mais caseiros contam pelo entusiasmo e
vontade de participar. O importante é o resultado e, o reconhecimento
mundial, é prova de que o empenho vem dando certo.

A comida
O famoso frango caribenho (Jerk chicken) é o cheiro que domina as ruas
de Notting Hill, porém espetinhos cada vez mais diversificados dão as
caras e ditam os sabores da festa. Desde chips até sanduíches é
possível encontrar pelas ruelas do Carnaval. E, é claro, a bebida é a
cerveja – gelada somente com muita sorte.

Fatos e Números:
→ Em 44 anos de existência, o carnaval cresceu de 500 pessoas para se transformar na maior festa de rua na Europa.
→ O público do Carnaval equivale a 87 Arena O2 lotadas, ou a 11
Glastonbury Festival, ou 23 vezes mais que o Grande Prêmio F1 da
Inglaterra.
→ Notting Hill Carnaval gera mais de cem milhões de libras para a economia de Londres.
→ Cerca de 50 mil participantes estão diretamente envolvidos com a festa.
→ Estima-se que 140 mil europeus vêm a Londres exclusivamente para o evento – e este número está crescendo.
→ 300 estandes são montados durante o evento e cerca de cinco toneladas de frango são consumidas no Carnaval.
→ 150 mil plumas e 30 milhões de lantejoulas são utilizadas nas fantasias.
→ 100 litros de tinta de corpo são usadas para decorar as passistas e artistas.

Gilberto Gil emociona conterrâneos em Londres

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Cantando com um violão, e algumas vezes acompanhado pelo filho Ben, Gilberto Gil mostrou-se muito à vontade no palco do Barbican Theatre, na segunda-feira, 31 de março. Embalando um repertório composto por 18 músicas, algumas inéditas, que estão sendo gravadas para o próximo disco, e outras clássicas, que provocam nó na garganta daqueles que vivem longe. Depois de quatro anos sem compor, Gil brinca durante o show que o presidente Lula tem sido muito paciente com ele, concedendo dois meses por ano de folga do Ministério para se dedicar à música.

Após a primeira música, “Máquina de Ritmo”, Gil revela como sente-se feliz por voltar a Londres e poder apresentar-se no Barbican – primeiro local onde, durante o exílio, subiu num palco londrino. Contou que a cidade está em terceiro lugar em sua lista de favoritas, atrás de Salvador e Rio de Janeiro, respectivamente.

Com freqüência, Conversou e interagiu com a platéia, sendo chamado de ‘lindo’ e ‘gostoso’, que agradeceu lisonjeado e fez piada sobre ‘como é gostoso o meu francês’. Gil emocionou brasileiros e estrangeiros cantando em português, inglês e francês músicas que retratam as últimas três décadas de sua carreira, seguindo o projeto do disco que este show foi baseado Gil Luminosos. Não ficou de fora “Exotérico”, “Super-Homem”, “Aquele Abraço”, “Expresso 2222”, “Se Eu Quiser Falar Com Deus”, “Three Little Birds”, “Não Chores Mais” e “Tempo Rei”, que já compõem um espetáculo e tanto.

Citações de Gil durante show

– “Quando eu estava completando 64 anos de idade, junto com o autor, meu amigo Paul, pois nós somos do mesmo ano, mesma idade… Hoje eu vejo que é tão legal ter esta bela e incrível canção britânica, e cantada em ritmo de bossa nova.” O amigo Paul que Gil cita é o ex-Beatle McCartney, a música é “When I’m 64”.

– “Esta música que eu acabei de cantar, “Metáfora”, é uma das músicas que eu tenho pena e me sinto culpado por não cantar em inglês, para vocês poderem entender a letra, pois fala sobre esse brilhante artista que é o poeta, de sua solidão e ao mesmo tempo de suas idéias tão iluminadas quando retrata coisas cotidianas da vida”.

– “Ele entrou no palco como um jogador de futebol, correndo para entrar no gramado (risos). Meu filho é flamenguista, eu sou fluminense no Rio, aqui eu torço pelo Chelsea. ‘Para vencer ou perder, seguimos o Azul’ (grito da torcida do Chelsea que rima em inglês). Por que eu vivi lá nos primeiros anos que estive aqui, perto do estádio, daí me tornei torcedor do Chelsea. Eles eram ruins na época, agora que eles estão melhores, muito dinheiro, podem contratar bons jogadores… Futebol e brasileiros, um objeto comum em nossas conversas, não temos escapatória (mais risos)”, Gil comenta e discorre sobre sua paixão pelo futebol após seu filho, Bem Gil, subir ao palco.

– “Este foi um baião que é um estilo dentro da família do forró, como é o xote, o xaxado, enfim, a música brasileira é uma mistura, sobre influências de todos os lugares, Europa, África. Então vou tocar um xote novo pra vocês”, resume antes de cantar “Despedida de Solteira”.

– “ ‘A Faca e o Queijo’ é uma música que fala sobre o relacionamento do casamento. Há muitos anos eu escrevi uma música pra minha esposa, daí ela reclamou que eu não dedicava mais música nenhuma pra ela e, então, eu escrevi esta. Eu espero que ela tenha gostado. Eu gostei!”. Em meio a risadas, alguém na platéia berra “Quem é a faca e quem é o queijo?” e Gil se delicia numa risada gostosa “Fantástico!”, mas não revela quem é quem.

– “Eu escrevi esta música quando estava em Senegal, dois anos atrás, em meio a preparações e reuniões com pessoas de todo o mundo para preparar o festival de arte que acontecerá ano que vem no país. O slogan da África agora é a renascença do continente. A África e o último local que o processo ainda tem que acontecer em totalidade, realmente. É o único lugar no mundo… Europa está ok, América do Norte ok, América do Sul nós estamos (pausa)… ok, Ásia está aí, olha a China com os Jogos olímpicos. A África ainda merece mais nossa atenção”, discursou antes de cantar em francês “La Renaissence Africaine”.

– “Quando eu fui para Los Angeles, em 1970, pra grava o álbum ‘O Rouxinol’ e tinha esta música, escrita originalmente em português, eu acabei fazendo uma tradução bem ruim para o inglês… Mas vou cantar as duas versões agora para vocês”, desculpa-se sem muito motivo.

Público pede músicas em show de Milton com Belmondo

Uma noite para ficar na história do pequeno clube Jazz Café, em Camden Town

Assim pode ser descrita a fantástica apresentação de Milton Nascimento com a banda francesa de jazz Belmondo, um incrível quinteto composto pelos músicos Lionel Belmondo, no sax e flauta, Stéphane Belmondo, no trompete e metais, Eric Legnini, ao piano, Thomas Bramerie, no baixo acústico, e André Ceccarelli, na bateria. A apresentação marcou a estréia do CD que os jazzistas fizeram em homenagem ao músico brasileiro – e tiveram a oportunidade de tê-lo como convidado! A gravação do CD, em Paris, contou também com a participação da Orquestra Nacional d’Ile de France.

Com uma abertura instrumental, Milton sentou-se no topo da escada que dá para o palco, vinda do restaurante-terraço, curtindo os primeiros acordes da noite, como outra pessoa qualquer da platéia. Descendo ao palco, cantou sucessos como “Ponta de Areia”, “Nada Será Como Antes”, “Travessia” e “Milagre dos Peixes”. Realmente, Milton Nascimento merece um palco maior, numa casa mais condizente com sua importância como músico, mas qualquer oportunidade de vê-lo deve ser agarrada com ambas as mãos, como descreveu crítico inglês

Os fãs que gritaram por “Maria, Maria” tiveram o pedido atendido, com direito a uma improvisação espetacular dos franceses, que foram tomados de surpresa quando Milton iniciou a canção, sozinho com seu violão. Mas já na segunda estrofe, os franceses acompanharam a música, primorosamente, diga-se de passagem, chegando até a liderar e chamar o público para fazer o coral “arre, arrea, arre, arre, arre ie ie”.

Definitivamente, um espetáculo para ficar na história de um clube de esquina, de jazz, em Camden Town.

Daniela Mercury ofereceu o Canto da Cidade aos imigrantes brasileiros

By Randes Nunes

Após uma apresentação estonteante no domingo, 1º de junho, com mais de duas mil pessoas, na Brixton Academy, Daniela Mercury se superou no show de terça-feira, 3, no Guanabara, recebendo um público bastante reduzido, mas que pulou e dançou samba-reggae como se estivesse em Salvador.
Sorrindo sempre e trabalhando como se estivesse de férias, Daniela atendeu os vencedores da promoção do Brazilian News com uma alegria contagiante logo depois da passagem de som na terça-feira. Fotos, autógrafos, presentes e choros a parte, Daniela explicou e desculpou-se pela falha da produção e organização que não conseguiram trazê-la a tempo de falar com eles após o show de Brixton.
Ainda com o relógio apertado, ela conversou relaxadamente mais de vinte minutos com o Brazilian News.
– A poucos minutos de entrar no palco você está aqui super à vontade conversando com a gente. Você não fica mais nervosa?
Daniela Mercury: Esta é a quinta ou sexta vez que venho à Inglaterra, é a 13ª turnê internacional então eu já vou ficando mais tranqüila, mas internamente sempre tem uma adrenalina nos minutos antes de subir ao palco. Ás vezes eu nem me dou conta do quão nervosa eu fico, porque a adrenalina se transforma em outra coisa, e serve também para aquecer o corpo, para preparar a gente num momento de muita atenção, de concentração, de entrega, o que me ajuda a entrar no palco com muita energia. Já pensou se a gente não tivesse emoção, se tudo fosse muito brando, e eu não sou branda, eu sou extremamente intensa em tudo. Eu sempre pergunto a minha mãe o motivo dessa energia toda, se foi a comida, se foi genética… Quando eu era criança meu apelido era pinga-fogo pra vocês verem, a pessoa não era quieta! Não foi à toa que virei bailarina, para poder concentrar essa energia toda e botar pra fora, me expressar. Sempre fui muito expressiva, comunicativa, mas também tenho meu lado reflexiva, quietinha. Mas toda a eletricidade, a moleca que eu sempre fui, se coloca no palco.
– Como você iniciou sua carreira na música? Você compõe e interpreta, quais são a suas influências mais fortes?
Daniela: Acho que a partir da dança eu virei artista. Meu pai sempre cantava muito em casa pra gente, eu acordava aos domingo ouvindo vários clássicos, até cheguei a gravar um cd de clássico incluindo “Beatles” que eu tava cantarolando na passagem de som. E toda minha família, ninguém cantada ou tocava, minha irmã mais nova, Vânia Abreu, também virou cantora, meu irmão mais novo era DJ, o mais velho também já teve uma empresa de som. Minha irmã mais velha, que não é cantora, canta lindamente. Muitos amigos acabaram se profissionalizando também. E foi com um grupo de amigos que faziam serenatas que eu descobri que podia cantar. E fui cantando, mas eu não pensava em ser cantora, não. A música foi me convidando, tive convites para fazer trio elétrico por muitos anos, fiz barzinho por muitos anos. Depois para fazer parte da banda de Jerônimo, depois da de Gil. Na época eu já tinha iniciado de carreira, tinha minha banda, era solista, mas esperei definir qual realmente seria meu caminho, escolher o que eu iria fazer conceitualmente para depois assinar contratos. Eu cantava muito samba-jazz na noite, mas quando vem esse batuque, essa coisa de carnaval baiano, essa antropofagia baiana que engole tudo, mistura tudo… Daí a cantora resolveu fazer samba-reggae e ser preta!
Mas desde os 13 anos que eu escrevo poesia. Como minha tia escrevia poesia, minha vó portuguesa, Josefina, recitava poesia, daí acho que eu fiquei com esse gosto pela poesia. Juntando com a música o que eu tentava escrever… Mas acho que as canções acabam nascendo junto com a letra, minhas impressões e reflexos, várias dos meus primeiros dois discos ainda. Músicas que foram sucessos na Bahia, que o Brasil não conhece muito “Vida que vida é uma saída…”, é minha maneira de ver o mundo. Os títulos dos meus discos quase todos são meus, de canções minhas.
– Em qualquer lugar do mundo que você vai esta música ainda é e, provavelmente sempre será, reconhecida. Qual tua relação com esta canção que é de tua autoria?
Daniela: É engraçada, pois “O Canto da Cidade” é uma música que fala do negro “A cor dessa cidade sou eu”, e da discriminação “Não diga que não me quer, não diga que não quer mais”, e eu aqui, quando cantei em Brixton, dediquei aos brasileiros que moram aqui. Que têm uma vida muito difícil longe de sua família, longe de seu país, de sua cultura. Pois eu sei o que é ficar muito longe de casa, sei o que é sentir saudades, parece que sempre há algo faltando. Então quando eu cantei, eu vi que “O Canto da Cidade” também simbolizava essa luta dos imigrantes para ser cidadão. É o que os brasileiros têm que cantar pra essa cidade, pois todos os brasileiros iluminam qualquer lugar que eles vão, que é essa força de vida que a gente têm. Você me perguntou… Daniela de onde vem essa energia? Acho que vou responder agora: É porque eu sou brasileira!
– A Daniela moraria fora do Brasil?
Daniela: Eu acho que os brasileiros, pelo menos a maioria, não decide morar pra sempre fora do país. Vem morar por necessidade, conseguir um dinheiro a mais pra enviar pra família, ter uma vida melhor, ou por sonho de conhecer o mundo, de dialogar com outras culturas, de se aperfeiçoar. Eu duvido que eles saiam querendo ficar fora, e eu jamais seria essa brasileira pra mudar isso. Desde pequena como bailarina eu tinha esse sonho de viajar, dançar em todos os lugares do mundo, todo mundo quer voar! Mas eu já não consigo sair da Bahia, sou uma das poucas artistas, creio que da minha geração, eu fui a primeira que decidi ficar em Salvador. Eu vivo no avião, mas minha casa é lá! Ano passado eu fiz uma brincadeira de ficar contando os trechos aéreos, 312! Isso não é morar em lugar nenhum, não é?!
– Para você como artista, como está o nosso Brasil hoje?
Daniela: Eu sou filha de assistente social, sempre acompanho o que está acontecendo no mundo, e faço um pedido a todos os brasileiros para colocar educação em primeiro lugar. Eu acho que o brasileiro não se manifesta, eu queria que as pessoas falassem mais, reclamassem mais, acho que é importante pra exercer nosso papel de cidadão. Outra coisa é que falamos muito de direitos, mas muitos esquecem que o cidadão também tem deveres. Por isso é nosso dever lutar por isso, cuidar do que é público, respeitar os espaços públicos, exigir que a escola pública seja melhor com os pais e alunos, sabendo que são eles que pagam por tudo aquilo através dos impostos. Mas uma população que não está preparada para assumir este espaço tem que ser educada para isso. Por isso que eu acho que educação deve ser prioridade para o Brasil melhorar, ou vamos ficar sempre pra atrás. Com nossa economia mais estabilizada nos temos que projetar nossos sonhos pro futuro e começar agora agir para melhorar a educação. Mas isso agora, no presente, pois a partir da educação as outras questões irão melhorar consequentemente, como a questão indígena que é complicadíssima. Tinha um amigo meu que falava que as pessoas tinham que aceitar o mundo como ele é, e eu falo que aceitar é respeitar. Isso vem com a educação do povo!